sábado, 18 de março de 2017

'Operação Carne Fraca': Carne podre era 'maquiada' e vendida no Brasil e no exterior, diz PF

Compartilhar


Principais frigoríficos do país são investigados na Operação Carne Fraca. A Justiça Federal do Paraná também determinou o bloqueio de R$ 1 bilhão das investigadas

Jacqueline Saraiva/Correio Braziliense

Sábado, 18 de março de 2017

Beto Novaes/EM/D.A Press
 
Alguns dos principais frigoríficos do país estão na mira da Operação Carne Fraca, que cumpriu hoje 309 mandados judiciais em seis estados e no Distrito Federal. A ação da Polícia Federal (PF), em conjunto com a Receita Federal e o Ministério Público Federal (MPF), investiga o envolvimento de fiscais do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (Mapa), a partir de superintendências federais da Agricultura em vários estados, em um esquema criminoso que liberava licenças e fiscalização de frigoríficos de modo irregular.
 
Há indícios de que as empresas investigadas, que têm mais de 60% do mercado de carnes no país, tenham vendido até carne com prazo de validade vencido, maquiadas com ácido ascórbico para disfarçar o mau cheiro e embaladas com novo prazo de validade, de acordo com o delegado federal Maurício Moscardi Grillo. As vendas dos alimentos ocorriam tanto no Brasil quanto no exterior. A Justiça Federal do Paraná determinou o bloqueio de R$ 1 bilhão das investigadas.

Outras irregularidades também foram identificadas, como a utilização de quantidades de carne muito menor do que a necessária na produção dos produtos, complementados com outras substâncias; a utilização de carnes estragadas na composição de salsichas e linguiças – no caso desta até cabeças de porcos eram usadas na composição do produto; a 'maquiagem' de carnes estragadas com ácido ascórbico, substância considerada cancerígena; carnes sem rotulagem e sem refrigeração; lotes de frango moídos com papelão e há relatos de que até água era injetada na carne para que o peso aumentasse, além da falsificação de notas de compra de carne. 

De acordo com a PF, a "Carne Fraca" é, em números, a maior apreensão do tipo já realizada pela corporação no país. A investigação, iniciada há quase dois anos, indica que empresas do setor como BRF Foods, proprietária das marcas Sadia e Perdigão, e JBS, dona da Friboi e da Seara, estão entre as envolvidas no crime. Executivos das duas empresas foram presos hoje. De acordo com a Receita Federal e a PF, além dos 309 mandados expedidos pelo Juízo Federal da 14ª Vara Federal de Curitiba, são cumpridos mais de 190 mandados de busca e apreensão em empresas e residências dos principais envolvidos.
 
Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
 
 Ministro citado 
O ministro da Justiça, Osmar Serraglio, é um dos citados na investigação da Carne Fraca. Em áudios interceptados pela PF, ele conversa com o suposto líder do esquema, chamando-o de "grande chefe". O ministro, no entanto, não é investigado. Em sua decisão, o juiz federal Marcos Josegrei da Silva, da 14ª Vara Federal de Curitiba, diz que o envolvimento do Ministério da Agricultura é "estarrecedor" e que o órgão "foi tomado de assalto - em ambos os sentidos da palavra - por um grupo de indivíduos que traem reiteramente a obrigação de efetivamente servir à coletividade."
 
O delegado federal Maurício Moscardi Grillo afirmou que parte do dinheiro arrecadado com as operações ilegais abastecia o PMDB e o PP. "Dentro da investigação ficava bem claro que uma parte do dinheiro da propina era, sim, revertido para partido político. Caracteristicamente, já foi falado ao longo da investigação dois partidos que ficavam claros: o PP e o PMDB", afirmou. 
 
Afastados por não colaborar 
O esquema seria liderado por servidores ocupantes de cargos de chefia e administração da Superintendência do Ministério da Agricultura no Paraná. Com a participação de outros funcionários a eles subordinados, estariam recebendo propinas pagas por executivos ou diretores de empresas. Segundo a investigação da PF, os fiscais agropecuários que se negavam a compactuar com a organização criminosa eram afastados do trabalho, substituídos ou até exonerados das funções, substituídos por outros que faziam o trabalho ilegal continuar. Além da corrupção cometida por esses agentes públicos e empresários, a operação inclui também crimes contra Saúde Pública.
 
A PF afirma que a investigação começou justamente porque um fiscal não aceitou ser removido quando descobriu fraudes em uma das empresas investigadas. No relato de uma das funcionárias consta que uma das empresas também comprava notas fiscais falsas de produtos com SIF (Serviço de Inspeção Federal) para justificar as compras de carne podre. Um dos fiscais, que teria "incomodado" os donos da empresa foi destituído do cargo no mesmo dia em que fiscalizou a empresa e detectou os problemas. Vários passaram pelo mesmo procedimento.

De acordo com o documento expedido pela 14ª Vara Federal de Curitiba, parte das irregularidades foi relatada por administradores da empresa Primos Agroindustrial Ltda, localizada em Bocaiúva do Sul (PR). Eles reclamavam sobre a exigência do pagamento de propinas a agentes fiscais e de inspeção, chamado de "ajuda de custo", para que fossem emitidos certificados para as cargas entregues em Curitiba (PR). "Prática essa que seria comum a todos os frigoríficos fiscalizados no Estado do Paraná, inclusive com valor estabelecido pelo próprio Ministério da Agricultura, por meio do superintendente federal de Agricultura", diz o documento. 
 

Defesas 

Em nota, a empresa JBS se defendeu das acusações. "Em relação à operação realizada pela Polícia Federal na manhã de hoje, a JBS esclarece que não há nenhuma medida judicial contra os seus executivos. A empresa informa ainda que sua sede não foi alvo dessa operação", diz o texto. A BRF ainda não se pronunciou sobre o assunto.
 
O Ministério da Justiça afirmou em nota que o líder da pasta soube hoje, "como um cidadão igual a todos", que teve seu nome citado em uma investigação. "A conclusão tanto pelo Ministério Público Federal quanto pelo juiz federal é a de que não há qualquer indício de ilegalidade nessa conversa degravada", diz a nota. 
 
O ministro da Agricultura, Blairo Maggi, também se pronunciou sobre o assunto por meio de um texto oficial. O líder da pasta afirma que a investigação aponta "um crime contra a população brasileira, que merece ser punido com todo o rigor". "Muitas ações já foram implementadas para corrigir distorções e combater a corrupção e os desvios de conduta, e novas medidas serão tomadas", afirmou. 
Compartilhar

Author: verified_user

0 comentários: