A ação Penal julga suposta tentativa de golpe de Estado se fundamentando por atos contra o Estado Democrático de Direito quando os três poderes sofreram ataques no dia 08 de janeiro de 2023.
A princípio, afirmo que as instituições da República devem guardar a democracia, e qualquer ato comprovado que afronte a estabilidade política e pregue ruptura institucional, deve ser combatido e punido de acordo com as Leis da República Federativa do Brasil, cabendo a nossa Suprema Corte fazer um julgamento justo e tomar as devidas precauções para evitar fazer um julgamento político. Durante a sessão realizada nessa quarta-feira (3), tanto a defesa do general Augusto Heleno, quanto a defesa do ex-presidente Bolsonaro, chegaram a sugerir que o julgamento seria político, e argumentaram, que em caso de condenação, seria cometida uma injustiça similar ao famoso caso Dreyfus, quando um militar francês, judeu, foi injustamente acusado de traição à pátria e condenado à prisão perpétua em 1894, um veredito depois anulado.
Não custa nada lembrar, que alguns inocentes já foram presos – e depois absolvidos- sob alegação de terem participado do suposto ato golpista de 8 de janeiro. Um morador de rua, chamado Geraldo Filipe da Silva, foi um dos primeiros a ser preso e posteriormente absolvido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), pois não havia provas da sua participação nos crimes. O ministro Alexandre de Moraes chegou a prender outros indivíduos em situação de rua, mas alguns foram absolvidos posteriormente, em especial porque suas defesas argumentaram que eles foram ao local em busca de comida ou por curiosidade, sem intenção de participar das ações. Isso é a prova de que o Brasil está dividido, pois prender cidadãos porque estavam no lugar errado, na hora errada, é um ato que exige profunda reflexão.
O Brasil já tem um bom histórico golpes de Estado. Ainda na época do Império, o mais famoso foi a “noite da agonia”, quando o então imperador Dom Pedro I mandou o exército invadir a sede do Poder Legislativo – na época, no Rio de Janeiro – na madrugada do dia 13 de novembro de 1823, sob a alegação de que o parlamento estava “diminuindo o poder do imperador”. Na realidade, o parlamento estava era a redigir a primeira Constituição, inspirada nos valores do positivismo e que ampliava os poderes do Poder Legislativo e criava o princípio da tripartição dos Poderes (como existe hoje), o que de fato, diminuiria o poder do imperador, pois ele, além de ser o chefe do Executivo, tinha também o tal Poder Moderador, uma espécie de quarto poder que dava a D.Pedro I o “direito” de subjugar os demais Poderes. Vários deputados foram presos e deportados.
No dia 15 de novembro de 1889, outro golpe, desta vez para destituir o governo imperial, que não tinha boas relações como o Exército, embora, alguns militares de alta patente, tivessem uma certa simpatia por D. Pedro II, inclusive o próprio Marechal Deodoro da Fonseca, que ficou na história como sendo o “proclamador da República”. No Rio de Janeiro, os partidários do regime republicano insistiram que o Marechal Deodoro da Fonseca, um monarquista, chefiasse o movimento revolucionário que substituiria a Monarquia pela República. Depois de muita insistência dos revolucionários, Deodoro da Fonseca concordou em liderar o movimento militar. Na verdade, ele foi usado. Com a proclamação da República, a monarquia chegou ao fim e a família imperial partiu para o exílio.
No ano de 1930, estoura outro golpe, desta vez liderado por Getúlio Vargas, o movimento conhecido como Revolução de 1930, depôs de imediato o presidente Washington Luiz e impediu a posse do presidente eleito Júlio Prestes, dando assim, fim a República Velha, onde dominava a chamada “Política do Café com Leite” – porque havia um acordo entre os políticos dos estados de São Paulo e de Minas Gerais para que se revessassem no poder, com os cargos de presidente e vice-presidente da República.
No ano de 1937, com a desculpa de que os comunistas estavam intentando tomar o poder no Brasil – e isso tinha um fundo de verdade – um general do baixo clero, Olímpio Mourão Filho, forjou um documento chamado de “Plano Cohen” para justificar outro golpe, o do Estado Novo, que além de confirmar Getúlio Vargas no poder por mais oito anos, promoveu um grande ataque às instituições, fechando o Congresso Nacional, extinguido mandatos e partidos políticos e promovendo violenta repressão aos adversários. O Estado novo, na verdade, foi “um golpe dentro de outro golpe”.
Outro golpe que merece ser citado é o chamado golpe preventivo, que destituiu o presidente Carlos Luz, em 1955 – que passou apenas três dias no cargo – sob a justificativa de garantir a posse do presidente eleito Juscelino Kubistchek de Oliveira. Esse movimento foi liderado pelo marechal Henrique Teixeira Lott.
Nove anos depois, aconteceu a Revolução de 1964 – que alguns a apelidaram de “golpe militar de 1964”, que instituiu um período de vinte e um anos de governo liderado pelos militares. A bem da verdade, os militares não deram golpe algum, pois quem decretou vago o cargo de presidente da República foi o Congresso Nacional, cujo presidente à época era o senador Auro de Moura Andrade. Com a decretação da vacância, ascendeu ao cargo máximo da República, o presidente da Câmara dos deputados Ranieri Mazzili, que governou de 2 a 25 de abril de 1964. Durante o curto mandato de Mazzili, o próprio Congresso Nacional convocou eleições indiretas para o cargo de Presidente da República, mais precisamente no dia 11 de abril, e foi eleito o Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco, com 361 votos, inclusive com os votos de Afonso Arinos, Franco Montoro e Ulisses Guimarães.
Castelo Branco tinha a intenção de apenas “organizar a casa” e convocar eleições diretas logo em seguida, porém isso contrariou a linha dura do Exército, liderada na época pelo general Costa e Silva. Com a permanência dos militares, foram organizados vários movimentos de resistência, guerrilhas urbanas que promoviam assaltos, sequestros e atentados à segurança nacional, o que naturalmente forçou o endurecimento do regime, pois muitas dessas organizações abrigavam espiões infiltrados que estavam a serviço de governos autoritários estrangeiros, que aspiravam implantar no Brasil uma ditatura de inspiração marxista-leninista, e isso está fartamente documentado na obra “1964 - O Elo Perdido. O Brasil nos Arquivos do Serviço Secreto Comunista, de autoria dos jornalistas Mauro "Abranches" Kraenski e Vladimir Petrilak.
Eduardo Jorge e Fernando Gabeira, que integraram esses movimentos subversivos, confirmam que a verdadeira intenção dos grupos armados à época (VPR, Colibri, MR-8 e outros), era realmente implantar a ditadura do proletariado e não restaurar a democracia, como propagavam. Há vídeos na plataforma Youtube, onde os dois confirmam essa assertiva.
Mesmo assim, no ano de 1979, o presidente João Batista de Oliveira Figueiredo, o último presidente do regime militar, decreta a anistia para todos os dissidentes e opositores do governo. Muitos deles voltaram à cena política, conquistaram mandatos e seguiram as suas vidas.
Atualmente, a Suprema Corte investiga uma tentativa de golpe de Estado, e de fato, tem que investigar e punir quem participou dos atos criminosos de 8 de janeiro de 2023, porém é de bom alvitre não criar bodes expiatórios, porém acredito que a anistia, neste momento é a única forma de pacificar a nação, e assim avançarmos rumo ao fortalecimento da democracia e do Estado Democrático de Direito, sempre respeitando as instituições e as leis.
(*) Especialista em Ciência Política, suplente de vereador (PL).
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